Tal como
podemos dizer que a segunda guerra mundial só acabou quando o Exército soviético
saiu de grande parte da Europa do leste, há pouco mais de 20 anos, também
podemos dizer que a desintegração da União Soviética é um processo que ainda
não acabou. É isso que explica o que se passa na Ucrânia.
Bastaram também
pouco mais de 20 anos para que a Rússia resolvesse recuperar algum do
território perdido. Um império é um império. E o maior país do mundo nunca
deixou de se considerar um império. A glória perdida é trauma demasiado recente
para não ter solução. Afinal, populações que falam russo e estão em território
onde a Europa não está, estão mesmo à mão de anexar.
Já havia
precedentes. A Transnístria, uma estreita faixa de terra entre a Moldávia e a
Ucrânia, de onde os soldados russos nunca saíram, apesar de ser oficialmente
território moldavo, é, na prática, uma província russa. Diz quem visita que é
um museu soviético ao ar livre. Mas também a Abcázia e a Ossétia do Sul,
territórios oficialmente georgianos, que a Rússia governa com alegre impunidade
e onde observadores internacionais não podem entrar.
Putin ocupa a
Crimeia. Putin fabrica um referendo na Crimeia ou, noutra versão, consente um
referendo fabricado na Crimeia. Putin celebra a ocupação da Crimeia. Putin paga
pensões de reforma em dobro aos habitantes da Crimeia. E assim a Rússia recupera
um território simbólico, que ainda lhe permite dominar o Mar Negro sem ter que
andar a discutir contratos de aluguer da sua base naval na Crimeia (que nunca
foi desmantelada desde que a Ucrânia se tornou independente).
Mas Putin não
para. Putin põe tropas na fronteira com a Ucrânia. Putin diz que não estão
tropas na fronteira. Mas as tropas não se mexeram. Putin diz que é melhor não
haver referendos no leste da Ucrânia. Mas fazem-se referendos com vigilância
armada que acabam com percentagens norte-coreanas a favor de uma autonomia
independente. O facto de os líderes destes movimentos separatistas serem
rufiões com ligações à Rússia e ao exército russo é certamente um acaso.
Por muito
cuidado com que a Rússia reaja a estes referendos, apelando enigmaticamente a
uma implementação pacífica dos seus resultados, parece claro que há uma
estratégia de Putin que passa por vários caminhos. Ou criar no leste da Ucrânia
um novo Estado fantoche com proteção militar russa. Ou aproveitar ao máximo um
leste ucraniano autónomo que a Ucrânia não consiga dominar. Ou, simplesmente,
fazer parte de qualquer solução de governação da Ucrânia que tenha que ser
encontrada a seguir às eleições presidenciais ucranianas deste mês. Qualquer
opção é uma vitória. E uma recessão económica vale bem um Putin na história
como um moderno conquistador.
Enquanto isso,
sai uma nova bateria de sanções europeias, que, com certeza, deixa Putin
amedrontado. Se não nos esquecermos que a Ucrânia pediu a adesão à União
Europeia em 1994 e que nunca houve grande vontade ou entusiasmo em negociar
este pedido, percebemos que a Europa move peças numa só direção, à espera que
algo aconteça, desde que não seja muito incómodo. Já Putin joga com várias
peças em todas as direções e em movimentos variados. É fácil perceber quem vai
ganhar.
Importa-se de me contar exactamente o modo como o actual Governo tomou o poder na Ucrânia?
ResponderEliminarBurrice cada um toma a que quer,mas não avalie mal todo o leitor casual...
Não me importo nada de explicar. Foi um processo conturbado e muito suspeito. Só acho que isso é outro assunto. Porque o texto pretendia apenas abordar a forma como a União Europeia lida com o que se está a passar no leste da Ucrânia face a Putin. Quer se goste quer não, Putin sabe o que quer e está a ganhar.
EliminarO referendo na Crimeia foi fabricado? Os Russos do sul e leste da Ucrania quando confrontados com a possibilidade de genocidio devem ficar quietos e calados? Quais as convicções ideológicas de uma boa parte dos membros do governo de Kiev incluindo Andriy Parubiy Secretario da Defesa? Os paramilitares neo-nazis do Right Sector foram integrados na nova Guarda Nacional Ucraniana? Foram responsáveis pelo massacre em Odessa? Sera razoável que conscientes do perigo em que se encontram a população Russa da Ucrania olhe para a Russia como um naufrago ao avistar uma tábua de salvação? E razoável confundir isto com imperialismo/expansionismo Russo?
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