Emmerich
Krause é um Professor emérito de diversas Universidades do Estado de Turíngia,
na Alemanha. A sua tese de doutoramento é uma grossa reflexão de 4 volumes e
meio intitulada "Ensaio sobre a Dinâmica Contratual Consoante o Credor -
Contributo para uma Teoria Dinâmica do Dinamismo Contratual". O meio
volume é apenas a bibliografia consultada. Esta interessante obra, que está a
marcar a ciência jurídica contemporânea, procura explicar a razão de haver
contratos com destinos muito diferentes consoante as partes envolvidas. O
Professor Krause deslocou-se a Portugal na semana passada, pois parece que
somos o país mais avançado do mundo nesta matéria, e realizou trabalho de campo
valioso. Em rigoroso exclusivo, as notas do Professor Krause na sua viagem a
Portugal.
"Portugal,
que já deu novos mundos ao mundo, surpreendeu-me. Afinal, Portugal também está
a dar novos contratos ao mundo. Procurei por tantos países experiências que
comprovassem as minhas teses, mas nunca tinha encontrado nada assim. Para
simplificar, fiz uma categorização dos tipos raros de contratos que descobri e
que nunca tinham sido observados a olho nu:
1.
Contratos-fingimento - Esta curiosa categoria de contratos é muito
surpreendente. Trata-se de contratos em que uma das partes assume plenamente
que as suas obrigações não são para cumprir, sabendo, de antemão, que a outra
parte não irá exigir o seu cumprimento, nem se preocupar muito com o assunto.
São muito utilizados quando há compras a empresas alemãs de material militar ou
quando se vendem empresas à China. Determina-se que as empresas estrangeiras
têm que construir fábricas ou fazer outros investimentos, mas, passado uns
tempos, o dinamismo contratual inerente faz com que essas obrigações
desapareçam e fiquem adiadas até ver. É um extraordinário exemplo de obrigações
contratuais descartáveis, uma brilhante inovação portuguesa.
2.
Contratos-de-pedra - Dei este nome imortal a esta categoria de contratos. São
contratos que vivem, sobrevivem e tornarão a viver para todo o sempre. Trata-se
mesmo de uma situação de imobilismo contratual que daria para criar toda uma
nova tese da ciência dos contratos. São contratos tão inalteráveis e rigídos
que até dão para partir a cabeça de arremesso, se for necessário. Quando se
discute a sua alteração, decide-se sempre que não podem ser alterados sob pena
de o Estado de Direito acabar já amanhã. Exemplos destes contratos envolvem
sempre investimentos avultados em contratações público-privadas e pagamentos ao
Estado relacionados com energia. Admirável mundo novo contratual
português.
3.
Contratos de requalificação - Esta espécie exótica de contratos é uma
originalidade portuguesa. Diria mesmo que no glorioso firmamento contratual,
esta é a espécie que cintila destacada de todas as outras. Trata-se de
contratos de trabalho que contém em si os germes da sua própria destruição. Eu
explico. Através da celebração de um contrato de trabalho, poderá haver lugar à
requalificação. Só que não é a requalificação do trabalhador. É mesmo a
requalificação do contrato, que passa a ser requalificado na sua não
existência. Ou seja, através da requalificação, faz-se desaparecer o contrato
num golpe de magia. O contrato e o trabalhador. De génio. Estes portugueses
sabem o que fazem.
4.
Contratos-não contratos - Foi este o contrato pelo qual me apaixonei e ao qual
gostava de dedicar a minha obra final. Um contrato que se nega a si próprio. Um
contrato que é em si um não contrato. Um contrato que nega a sua própria
existência numa vertigem demente. Um contrato que se contorce e desaparece. O
exemplo mais típico e acabado deste contrato são os contratos envolvem pensões
de reforma do Estado. Num momento, existem. No outro, não. Num momento, pode
haver pensão. Passado uns meses, pode haver outra pensão bem mais baixa. E tudo
com o mesmo contrato. No fundo, não existe contrato nenhum. Desde o astrolábio
náutico que os portugueses não inventavam algo tão genial.".
O
Professor Krause não é apenas um cientista contratual. É mesmo o melhor
cientista contratual do mundo.
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